Posts recentes

Publicado originalmente no jornal Hoje em Dia, em 12/02/2012

Patrus Ananias

Belo Horizonte é território de encontro de gerações. Da esplêndida geração modernista que marcou forte presença na literatura e na política brasileiras, passando pela geração dos anos 40 do século passado, até as mais recentes, são muitos nomes que agitaram as ruas e o cenário cultural da capital mineira e fizeram história. Nesse contexto, falo da geração nascida na primeira metade dos anos 50, da qual tenho o privilégio de participar, e que formou seguramente uma turma da melhor qualidade que continua a deixar sua marca nos mais diferentes campos do pensar e do fazer humanos.

Uma das figuras mais marcantes, senão a mais marcante, desta geração foi José Maria Cançado, principalmente pela capacidade de aliar uma inteligência intelectual privilegiada com uma relação muito intensa com as ruas, com o povo. Ao contrário de boa parte de sua geração e de seus amigos, que fizeram opção pela vida acadêmica ou pela militância política mais metódica, Zé Maria fez a opção que podemos chamar de “andarilha” entre todos esses caminhos, marcada por uma procura insaciável e inquieta do povo. Manteve sempre o diálogo com a militância política e com a mais refinada produção acadêmica e universitária.

Guiava-o sobretudo uma intensa ligação com o Brasil, que o estimulava a desvendar os mistérios de nossa gente e de nossa produção cultural, não só literária, mas também nas outras manifestações artísticas. Tinha um profundo amor pela música popular brasileira. Preservou, de sua formação religiosa, uma inquietação cristã que o mobilizou muito.

Tinha uma produção vasta: no movimento estudantil, na produção intelectual, literária, ensaística, política. Em tudo, a marca de sua intensidade emocional que só fazia acentuar ainda mais seu talento. Começou muito jovem a colaborar na imprensa brasileira e nesta área talvez possamos identificar sua militância mais sistemática. Gostava do jornalismo literário, da crítica, da entrevista, da reportagem. De coração amplo, só não perdoava a mediocridade e a injustiça. A possibilidade de carreira acadêmica, iniciada já tardiamente, esbarrou no limite da sua saúde, que interrompeu precocemente sua trajetória. Deixou também a revelação do grande poeta, uma obra alentada neste campo, que se encontra em processo de explicitação. Ainda vamos descobrir muito do Zé.

Das marcas que nossa geração deixa para Belo Horizonte e para o Brasil, Zé Maria é, sem dúvida, a melhor expressão desse legado. Nosso ponto de encontro. O que mais nos mobilizou. Por tudo isso e muito mais, continua a aniversariar com todos nós que convivemos com ele e o amamos. Nós que guardamos na memória a ternura de sua risada e brindamos neste final de semana os seus 60 anos.