Minhas leituras e estudos estão mais voltados nos ultimos tempos para a História do Brasil, no desejo de observar a formação nacional para melhor compreender nossa realidade presente. No contexto mais amplo da nossa história, a escravidão ocupa necessariamente um lugar especial nas reflexões sobre a nossa formação. Fica cada vez mais claro, à luz da cultura brasileira, que a escravidão não está resolvida. Ela persiste. A escravidão segue entranhada nas relações humanas e sociais que permeiam a sociedade brasileira.
Nos anos que antecederam a abolição, os debates se concentravam sobre a questão da propriedade. Os donos de escravos reclamavam seu direito absoluto de propriedade sobre eles. Diziam também que o Estado não podia adentrar nas suas propriedades territoriais para fazer os registros dos escravos e verificar as suas condições de vida para assegurar, por exemplo, que os filhos de escravos nascidos libertos tivessem essa garantia mínima.
Há poucos dias, ouvimos na Câmara dos Deputados discursos que nos levaram de volta aos tempos da escravidão. Os representantes do latifundio e dos setores mais atrasados do agronegócio defendiam a tese de que os proprietários devem ser os responsáveis pela sua própria segurança e pela proteção das suas terras. E de que, para fazê-lo, precisam de armas à disposição.Dessa maneira, a segurança pública e a proteção da vida deixam de ser políticas públicas extensivas a toda sociedade para se tornarem assuntos privados. A segurança pública passa a ser questão pessoal – defende-a quem pode! Ou quem pode pagar por ela. O restante da sociedade fica à mercê dessa mercantilização do direito à vida, cada vez mais limitado em seu direito a uma segurança pública ampla, estratégica e dinamizada.
Vale dizer: estamos voltando aos tempos dos capatazes e jagunços. A classe média, os pobres, as pessoas que preferem a paz e a não-violência que se cuidem. O Estado está privatizando a segurança pública. E isso é o mesmo que está fazendo com a educação, com a saúde, com a Previdência Social. Nessa mentalidade governamental, quem puder que pague pelo serviço. E para o restante da sociedade, parece que querem deixar apenas as sobras e a barbárie.
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